
A Polícia Civil prendeu na manhã desta sexta-feira (12), em Presidente Prudente, quatro pessoas envolvidas num esquema de fraudes em vestibulares para o curso de medicina.
A Operação Asclépio, deflagrada nesta sexta-feira (12), foi conduzida em parceria com o Ministério Público Estadual (MPE), com objetivo de combater uma organização criminosa que “vendia vagas” em universidades. No total, 17 pessoas foram presas nas cidades de Andradina, Fernandópolis e São Paulo, além de Presidente Prudente.
Segundo a Polícia Civil, as investigações começaram após apuração de denúncia de um eventual esquema de fraude no vestibular para medicina da Fundação Educacional do Município de Assis (Fema), em abril de 2017.
A polícia informou que a direção da unidade descobriu que “terceiras pessoas” haviam se passado por cinco candidatos e feito as provas.
A Fundação Vunesp, organizadora do vestibular, ainda de acordo com a Polícia Civil, constatou “inconsistências” nas identificações datiloscópicas, nas assinaturas nas folhas de respostas e nas imagens captadas dos candidatos aprovados – em comparação com alunos matriculados no curso.
Um inquérito policial foi instaurado para apurar os crimes de organização criminosa, estelionato e falsificação de documento público.
O articulador, do que a polícia está chamando de “engenhoso esquema” de venda de vagas para ingresso em cursos de medicina, “cobrava” entre R$ 80 mil e R$ 120 mil por vaga – valores negociados de forma parcelada ou até mediante permuta de bens e imóveis.
“Com o avanço das diligências, apurou-se a constituição de sofisticada organização criminosa composta de três grupos, todos interligados: 1) Grupo familiar; 2) Grupo dos captadores e vendedores de vagas; e 3) Grupo de intermediários na Universidade Brasil”, cita a polícia.
Ainda de acordo com autoridades da segurança pública, o primeiro grupo, comandando pelo cabeça do esquema, coordenava todas as ações, “se valendo dos trabalhos de vários subordinados (seus familiares)”.
O segundo grupo surgiu da necessidade de se captar “vendedores de vagas”.
A polícia diz que, por conta do alto número de alunos, só os familiares do articulador do esquema não teriam condições de atender toda a “oferta de vagas” em universidades particulares e a procura de interessados.
O terceiro grupo é de pessoas ligadas à Universidade Brasil, que possui faculdade de medicina em Fernandópolis. A polícia diz que, sem este grupo, não seria possível obter “êxito no engenhoso crime”. Essas pessoas eram consideradas integrantes desta organização criminosa.
A operação contou com a participação de 350 policiais civis, que tiveram apoio de policiais de Minas Gerais e promotores de Justiça do Estado de São Paulo.
Foram cumpridos 55 mandados de busca e apreensão – 13 em Presidente Prudente – e 17 de prisões temporárias.
Os homens presos serão encaminhados para a Cadeia de Lutécia e, as mulheres, para a de Dracena.
Em Presidente Prudente, foram apreendidos documentos, dinheiro em espécie, cheques, motocicletas e veículos de luxo.
Nem a Polícia Civil nem o Ministério Público informaram, ainda, quantas pessoas poderiam ter sido beneficiadas pelo esquema. O valor total do dinheiro apreendido também não foi divulgado.
Inteligência
De acordo com informações obtidas pelas autoridades, segundo o Ministério Público Estadual, pessoas com maior capacidade intelectual usavam documentos falsos para se passarem pelos candidatos efetivamente inscritos, realizando as provas no lugar destes.
As investigações identificaram os alunos e os responsáveis pela ação fraudulenta, desvendando a existência de possível organização criminosa com atuação mais ampla, fora da Comarca de Assis, segundo o MPE.
“Os integrantes supostamente se dedicam a fraudar processos de transferência de alunos de uma faculdade para outra, sempre no curso de medicina. Ainda segundo a apuração, o esquema não conta com a participação de pessoas ligadas à Fema”, explicou o MPE.
Dezessete pessoas foram identificadas e tiveram suas prisões temporárias decretadas. Foram expedidos e cumpridos vários mandados de busca e apreensão, visando à coleta de provas. Houve ainda o sequestro de bens das pessoas ligadas à organização criminosa.
A operação contou com o trabalho de promotores de Justiça de Assis, Fernandópolis, São José do Rio Preto e São Paulo, além de 22 delegados da Polícia Civil de Assis, Dracena e Presidente Prudente.
‘Mina de dinheiro’
Em entrevista coletiva na sede do 8º Departamento de Polícia Judiciária do Interior (Deinter-8), em Presidente Prudente, o delegado Ricardo Fracasso, que coordena as investigações, informou que os participantes da organização “sofisticaram o esquema” criminoso. Eles contratavam uma terceira pessoa “inteligente”, que passava na prova do vestibular, mas quem efetivamente se matriculava era quem comprava a vaga.
As investigações, segundo Fracasso, indicaram que os participantes do esquema ingressavam em um curso, ficavam um período de seis meses a um ano e depois tentavam a transferência para outra faculdade próxima da região onde moravam e na qual não haviam conseguido passar no vestibular.
“Para que a organização criminosa funcionasse e tivesse êxito, precisaria da concordância de alguém dentro da faculdade. Aí nós identificamos as pessoas que recebiam e permitiam essa fraude na suposta elaboração das provas nesse processo de transferência. A condição exclusiva para a transferência era o pagamento”, disse o delegado.
“As pessoas que compraram as vagas e que não efetivaram a prova de ingresso ou que não efetivaram verdadeiramente a prova de transferência ou cumpriram os requisitos vão responder por crime de falsidade. Ou falsidade de documento público, falsidade de documento material ou falsidade ideológica”, explicou Fracasso.
Como os valores das vagas e os montantes recebidos eram elevados, a mãe de um dos investigados chegou a declarar, segundo o delegado, que o filho teria encontrado uma “mina de dinheiro”.
O nome escolhido para a operação faz referência ao deus da medicina e da cura nas mitologias grega e romana.
Outro lado
A Fundação Educacional do Município de Assis (Fema) informou, em nota ao G1, que todo o processo do vestibular para o curso de medicina da instituição é organizado e aplicado por funcionários da Fundação Vunesp.
“Sobre o processo de 2017, a Fema descobriu inconsistências no reconhecimento dos candidatos, informou à Polícia e abriu, imediatamente, um processo administrativo interno para averiguação dos fatos. Os envolvidos tiveram suas matrículas canceladas, reforçando o compromisso da instituição com os processos legais”, declarou.
Ainda em nota, “a Fema reafirma sua transparência e ética em suas atividades e está à disposição da comunidade e da Polícia para mais esclarecimentos”.
Já a Fundação Vunesp, também em nota ao G1, informou “que mantém sempre atualizados os seus procedimentos de segurança, entre eles identificação datiloscópica e gravação de imagens, para garantir a lisura de todos os vestibulares realizados. O caso específico da matéria em questão está sendo conduzido pela Polícia Civil/SP”.
Sobre a Operação Asclépio, deflagrada nesta sexta-feira (12), a Universidade Brasil esclareceu que é “vítima do esquema de fraudes envolvendo vagas de medicina em faculdades privadas no interior de São Paulo”.
“Em dezembro de 2018, um boletim de ocorrência foi aberto pela própria Instituição com o intuito de denunciar uma página no Facebook em que o administrador utilizava o nome da Universidade para cometer atos ilícitos, obtendo para si vantagens indevidas”, salientou, em nota.
Na ocasião, a reitoria da Universidade Brasil ainda fez uma declaração pública em cartório para ressaltar todos os seus compromissos com a legalidade e transparência do processo seletivo, enfatizando que as únicas taxas cobradas são as previstas no edital do vestibular, segundo a nota.
“A Instituição tomou o conhecimento nesta sexta-feira, pela Polícia Civil, sobre a investigação desta organização criminosa e já abriu sindicância interna para apurar eventuais responsabilidades”, complementou.
“A Universidade Brasil, como vítima e parte interessada de toda essa história, também se coloca à disposição das autoridades para prestar mais esclarecimentos e auxiliar em toda a investigação policial”, concluiu.
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